Blog do Samuka

Eu não precisava mais acordar tão cedo. Minha terceira série se passou no turno da tarde da E.E.P.G Paulo Setubal. Ao invés de acordar ao som de Eli Coimbra agora eu acordava por volta das nove da manhã com um som muito melhor: Minha mãe cantando! Não eram ensaios para apresentações de corais, nem estudos de técnica vocal. Eram melodias brotando da superfície áspera do velho tanque em nosso quintal no tempo em que as roupas precisavam de umas boas esfregadas antes de ficar de molho em bacias de alumínio.

Dava pra saber se ainda estava cedo pela intensidade do som. Bem de manhãzinha o som era forte e constante. Ao avançar das horas, as pausas eram maiores, possibilitando a ela obter maiores quantidades de ar entre o esforço dos braços em atrito com a pedra. Depois ficava mais baixinho. Vinha da cozinha enquanto ela separava o arroz das impurezas como se fosse um garimpeiro reconhecendo preciosidades entre as pedras brutas.

O repertório era vasto e contava com hinos dos Salmos e Hinos, cânticos de grupos mais modernos, mas sempre com a mensagem do evangelho entre os pentagramas. Alguns hinos, claramente, serviam para dar um pouco de consolo e amenizar a saudade do pai dela, meu avô Naor.

Outras músicas vinham do nosso som estéreo, novíssimo, comprado para tocar a bela coleção de vinis do Grupo Logus, Paulo Cesar, Jairinho e Wilma.

Essas canções criaram raízes no meu coração, brotaram e sua folhagem verde cobre tudo o que eu sou, porque enquanto ela cantava, falávamos entre nós com Salmos, hinos e cânticos espirituais e ela aumentava a porção do Espírito em sua vida, assim como implantava em mim a semente da canção que abençoa.